O Sangue e os Açoites da Fé Reformada: Por Que as Doutrinas da Graça Incomodam

A história da Igreja carrega nomes quase esquecidos, mas que se tornaram testemunhas vivas do preço de crer nas verdades da graça soberana de Deus. Talvez você mesmo não conheça, mas um desses nomes é Godescalco de Orbais, monge do século IX que ousou simplesmente expor o ensino de Paulo Romanos 9 e dizer que Deus, em Sua soberania, elege para a salvação e também para a condenação.

A mensagem que ele anunciava não era popular. Sua convicção na chamada “dupla predestinação” o levou a enfrentar a fúria das autoridades religiosas de sua época. Godescalco foi acusado de heresia, condenado em concílios e submetido à humilhação pública. Isso mesmo, ele foi açoitado diante de um grupo de pessoas, chegou a ser encarcerado em mosteiros e foi obrigado a ver sua confissão de fé ser queimada diante dos seus olhos. Tudo isso porque ousou ensinar que tanto a salvação, quanto a condenação é exclusivamente fruto da eleição de Deus, e não da vontade humana. Talvez tenha sido o maior nome na história da igreja a se opor ao ensino de que “os vasos de ira se preparam para a perdição”.

A verdade é que ninguém jamais foi perseguido, açoitado ou morto por defender o livre-arbítrio. Nenhum teólogo na história da igreja foi lançado às chamas por dizer que “o homem é livre para escolher o seu destino”. No entanto, ao longo da história, aqueles que se levantaram para proclamar a soberania absoluta do Senhor e a escravidão da vontade humana sofreram oposição cruel. Mas tudo normal num mundo caído. Sem novidades. As Doutrinas da Graça sempre causaram repulsa ao coração não regenerado, pois humilha o homem e exalta somente a Deus. O ensino de que “depende, não do que quer, nem do que corre, mas de Deus que se compadece” (Romanos 9.16) acaba com o orgulho humano e deixa o pecador despido de qualquer mérito.

A vida de Godescalco de Orbais nos faz ver que a fé reformada não é um mero adorno intelectual, como se “quem estudar, entende e crê”, mas eu diria que é simplesmente a confissão que já custou sangue, açoites e prisões. Crer nessas verdades não é confortável para ninguém; é tomar posição ao lado de uma verdade que sempre incomodou, sempre foi rejeitada, mas que continua sendo o Evangelho puro da graça de Deus. Muitos irmãos, hoje, sofrem com familiares e até mesmo com membros de suas igrejas simplesmente porque defendem as Doutrinas da Graça. Tudo normal até aqui. Estranharemos quando a verdade sobre a salvação não causar mais impacto em ninguém.

— Clinton Ramachotte

Clinton Ramachotte é membro da Igreja Batista em Moraes Prado, na capital de São Paulo.
Bacharel em Teologia pela FATERGE, e também pela ESTEC-REF. É também professor da matéria de Seitas e Heresias na ESTEC-REF.
Autor de obras importantes na apologética, como “Os 5 Solas e Eu: A Prática Piedosa dos Solas da Reforma”, “Resposta aos Adventistas do 7° Dia: Um Tratado Apologético”, “Desvendando o Islamismo: Dissecando a Religião Muçulmana”, dentre outras obras.

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